terça-feira, 4 de maio de 2010

Ezequiel - Parte Um

O sol mal havia se levantado e Ezequiel já pusera-se a trabalhar. Acordou cedo, tomou o desjejum e subiu a colina para cortar lenha. O inverno estava chegando e ele e sua mãe precisavam se aquecer da maneira que podiam. Não era fácil levar uma vida pobre e humilde como a deles, mas viviam afastados da cidade, num vilarejo pequeno com pessoas tão pobres quanto eles, se não mais. A mãe de Ezequiel, Ruth, tentava ajudar o filho como podia. Quando ele se levantava para o labor ela tentava arrumar a casa e preparar algo para comerem. Ela sabia que ele não a permitiria trabalhar enquanto estivesse doente como ela estava, mas era só o rapaz sair, e ela já se empenhava para poupa-lo de tanto trabalho.
Do alto da campina verde onde trabalhava, Ezequiel podia vigiar sua aldeia contra os constantes saques que sofriam. O exército do rei era impiedoso e os impostos altos demais para todos que ali viviam. Haviam poucos homens na vila e menos guerreiros ainda. A maioria havia morrido na guerra do reino de Házept. O pai de Ezequiel tinha sido um dos traidores de seu reino, e quando descoberto, condenado à prisão perpetua nas masmorras do rei. Ele poderia facilmente ter sido enforcado como os demais, mas era tão ardiloso e tão inteligente que o rei o guardara como estrategista de guerra. Vivia uma vida de nobre na masmorra. Nada que pudesse reclamar. Ezequiel e sua mãe foram condenados à vergonha e tiveram que se mudar de vilarejo constantemente.
Havia uma lenda no reino de Házept que descrevia um ser místico que libertaria o povo da opressão e da tirania quando o povo mais precisasse. O ser era descrito como um guerreiro com seis asas de anjo e uma enorme espada reluzente. Em tempos dificeis o povo precisava de algo em que acreditar e nesse momentos as velhas crencas e profecias esquecidas vinham bem a calhar. Ezequiel não cria na lenda e nem em esperancas míticas. Ele se indagava “porque eu devo depositar minhas esperancas em um ser irreal se meu sofrimeto é real?” Sua mãe tentava de todas as formas mostrar o quanto ele estava errado em pensar dessa maneira, mas o rapaz não dava ouvidos. Em parte, seu ódio às crencas antigas vinha do fato de seu pai ter sido um sacerdote da mesma religião. E Ezequiel odiava seu pai. Odiava muito.
Quando o sol comecou a baixar e a lua a ascender, Ezequiel se encaminhou para sua casa. A lenha que conseguira cortar os aqueceria por uns dois dias. Iria atras de alimento amanha. Se houvesse amanha. Do topo da colina ele contemplou algo que jamais havia imaginado. Ele resolvera ir mais adentro da floresta, contrariando os pedidos de sua mãe. Aquela floresta guardava algo perigoso e tão antigo quanto a terra. Ele foi mais longe hoje atras de lenha seca e agora pagava caro por sua desobediencia. Não acreditava no que via, mais sabia que era verdade em seu amago.
O sol se punha atras da colina, mas ainda podia se ver a figura de Ezequiel correndo desesperado ladeira abaixo, rumando para onde antes havia sua vila. Enquanto descia sua voz repetia as mesmas palavras em sua mente, como se cravasse os pregos de sua cruz “A aldeia foi atacada...e voce não estava lá...”

2 comentários:

  1. 'Se houvesse amanha', gostei disso. Gosto do jeito que vc escreve e de como usa as palavras a seu favor. já ganhou uma fã. :)

    ResponderExcluir
  2. Vindo de uma pessoa tão culta e com tanto talento a escrita só me resta dizer que fico extasiado com tal elogio. Muito obrigado, linda, e também sou seu fã.

    ResponderExcluir